Enfrentar a morte de uma pessoa querida é uma das provações mais difíceis por que alguém pode passar durante a vida. Nesses momentos, qualquer ajuda é bem-vinda - ainda mais se for especializada. Pena que, no Brasil, os enlutados têm poucos especialistas a quem recorrer. Isso é o que afirma a pesquisadora Cristina Marcos de Moura, autora da dissertação de mestrado “Uma avaliação da vivência do luto conforme o modo de morte”, no Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB). De acordo com a psicóloga, o assunto ainda é tabu por aqui.
Preocupada em ajudar indivíduos que perderam parentes ou amigos, a psicóloga adaptou o Questionário de experiência de luto (Grief Experience Questionnaire GEQ) para a realidade brasileira e o aplicou em alguns enlutados. O instrumento Entrevista de Avaliação de Luto é composto por 55 itens que representam 11 dimensões do luto, como busca por explicações, vergonha, rejeição e sentimento de culpa.
A entrevista considera três tipos de morte: naturais/esperadas, inesperadas/acidentais e por suicídio. Cristina pretendia aplicar o questionário brasileiro em pelo menos 300 voluntários, para que ele fosse validado e, na sequência, aprovado pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP). Mas enfrentou muita dificuldade para encontrar pessoas interessadas em ajudá-la. Por isso, optou pelo estudo qualitativo.
Ela entrevistou 13 pessoas (nove mulheres e quatro homens), entre 20 e 70 anos. A idade dos falecidos variava de 22 a 98 anos e a aplicação dos questionários ocorreu entre cinco meses a um ano e três meses dos óbitos. Seis dos participantes estavam de luto por morte natural (parada cardíaca e tuberculose, por exemplo), três por morte inesperada (como acidente de carro e acidente vascular cerebral) e quatro por suicídio.
Os indivíduos responderam a perguntas referentes ao que eles sentiam em relação ao parente/ amigo morto, a estratégias que eles adotaram para superar a dor e ao modo como avaliavam as circunstâncias da morte. As respostas permitiram à pesquisadora identificar padrões de comportamento para cada tipo de enlutado. Quatro dos participantes relataram ter vomitado logo depois de receber a notícia da morte. Sintomas como ansiedade, sentimento de vazio e irritação também são recorrentes.
"Algo que costuma acontecer, independente do modo de morte, é o isolamento do enlutado", afirma Cristina. "Isso acontece devido à tristeza que ele sente, à perda de interesse em qualquer coisa que não se refira ao ente querido morto", continua. Esse isolamento, explica a psicóloga, é natural e faz parte do processo de luto. É um tempo em que o enlutado recorda momentos que passou ao lado do ente querido, olha fotos e pensa em como será sua vida dali para frente. Nos casos de mortes naturais e esperadas, as pessoas se isolam pela tristeza, por sintomas de depressão. Elas têm medo de levar a dor para os parentes.
É por isso que a psicóloga defende a existência de grupos de apoio a enlutados. "Nós não somos preparados para esperar a morte, nem a nossa nem a do outro. Somente no último semestre houve registro, no Brasil, de iniciativas isoladas de estabelecimento de grupos de suporte a enlutados por suicídio", comenta a pesquisadora. "Os profissionais de saúde precisam conhecer o processo de luto. É assim que se evita a consolidação de quadros depressivos, que podem gerar até tentativas de suicídio entre enlutados", aconselha.
ALÍVIO - As entrevistas de Cristina identificaram um novo componente no luto dos voluntários. O alívio, componente que pode ajudar na superação da tristeza, foi relatado nos enlutados por mortes inesperadas e morte esperada. Alguns deles se disseram confortados, nos casos de acidentes, por saber que o parente não ficaria inutilizado pelo resto da vida.
Quando a morte é esperada, a ideia de que o morto "descansou" é recorrente. Nesse tipo de luto a tristeza pode ser resolvida de dois meses a um ano. Em casos de suicídio o tempo médio é de dois anos. "Mas se a pessoa receber ajuda, ela elabora o luto de forma mais rápida e saudável, com o mínimo de sofrimento possível", garante a psicóloga. Além do mais, a ideia da morte também passa pela cabeça dos familiares de suicida, e o auxílio aos chamados "sobreviventes do suicídio" pode evitar outras mortes.
Fonte: Portal Ciência e Vida / UOL