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Cultura da autoestima é contestada por psicóloga

Enquanto instituições, terapias, profissionais e livros seguem vendendo o “resgate da autoestima”, a psicóloga americana Kristin Neff resolveu questionar um dos clichês mais repisados das últimas décadas. Para ela, a cultura que incentiva em cada um a avaliação positiva de si mesmo contribuiu para a atual epidemia de narcisismo.

Folha – Como uma autoestima elevada pode fazer mal?
Kristin Neff – Não é o fato de ter uma autoestima elevada que é prejudicial, mas o que se faz para consegui-la ou mantê-la. Você precisa ser o número um, precisa se sentir especial e melhor do que os outros. Se, por exemplo, a sua performance no trabalho está abaixo da média, você se sente abaixo da média.

Dá para manter a autoestima sempre em alta?
Não, isso não é sustentável. Para manter a autoestima em alta precisamos nos sentir melhor do que somos e achar que os outros são piores do que são. Só que não dá para ser melhor do que os outros o tempo todo. Você se sente bem quando recebe aquela promoção no trabalho, mas também se sente péssimo se não recebe. É óbvio que essa instabilidade faz mal à saúde. Pode levar à depressão e à ansiedade. Não dá para confiar na autoestima porque ela logo abandona você.

Por que a busca pela boa autoavaliação é tão prejudicial?
Porque acirra a rivalidade e pode levar à agressividade. Há quem sustente que muitas crianças praticam bullying porque têm baixa autoestima. Na verdade, elas obtêm sua autoestima colocando os outros para baixo, provocando, batendo. Assim se sentem melhores do que os

outros. Pessoas preconceituosas usam critérios como raça ou religião para se dizerem melhores em relação aos que integram os outros grupos. O preconceito vem desse sentimento de que o grupo ao qual pertenço é melhor do que o outro e de que tenho que me sentir melhor do que o outro.

Como a cultura incentiva essa busca de alta autoestima?
Desde cedo, com os pais, com a escola. Numa sociedade competitiva, você dirá às crianças que é preciso ser sempre o primeiro. Elas vão ficar se comparando o tempo todo, porque têm sido educadas na ideia de que devem sempre se sentir especiais e ganhar prêmios por serem as melhores. Todas essas formas de premiação que existem nas escolas incentivam a competição.

Qual o resultado disso?
Hoje, temos os maiores índices de narcisismo registrados graças a esse tipo de educação. É uma epidemia. Sou professora universitária há 12 anos e já vejo uma mudança nos meus alunos. Eles cada vez mais se sentem incomodados se tiram um B como nota. Meu filho ouve muito rap e eu noto essas letras lotadas de narcisismo.

As pessoas são apegadas à ideia da autoestima?
Sim. Atingimos o ápice da raiva quando alguém diz algo que, de alguma forma, mexe com o nosso ego, aquilo que, se aceitássemos, colocaria em risco nossa autoestima. Nos defendemos o tempo todo para protegê-la.

Mas não é certo tentar gostar de si mesmo?
Está certo gostar de si mesmo. O problema começa quando as pessoas se perguntam por que elas devem gostar de si mesmas. Há duas formas de se responder a essa pergunta: “Eu gosto de mim mesma porque sou um ser humano, tenho valor e sentimentos e mereço atenção”, e outra forma é dizer “Eu gosto de mim mesma porque sou melhor do que as outras pessoas”. Na cultura ocidental, tendemos a escolher a segunda resposta.

Fonte: Folha.com

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1 Comment

  1. Marisa disse:

    Concordo plenamente