A morte faz parte do desenvolvimento humano desde a sua mais tenra idade e acompanha o ser humano no seu ciclo vital, deixando suas marcas. Questões são constantemente formuladas: “De onde viemos e para onde vamos?” “Será a morte o final da existência, ou somente transição, o final do corpo físico, a libertação da alma? Haverá outras vidas? Será a alma imortal? O espírito se mantém tal como o conhecemos? Será a nossa existência um caminhar para a evolução de cada ser? Chegaremos à perfeição divina? Como preparar pessoas para esse fato tão presente na existência?
Considerando nossa existência terrena, quanto tempo viveremos e como será nossa vida? Teremos controle e poder sobre o nosso existir? Teremos o direito de saber sobre a nossa morte, como e quando será? Podemos nos preparar para esse momento? Estamos rodeados por um tecido cultural que determina, até certo ponto, como viveremos e como morreremos. Qual é o grau de liberdade, de ação, dentro desse tecido ou rede de valores, significados e representações? As perguntas continuam: por que pessoas jovens e saudáveis morrem rapidamente e pessoas idosas não o fazem? Por que pessoas adormecem e morrem no silêncio do sono, e outras lutam e se debatem até o último momento, com dores e sofrimentos atrozes? Por que pessoas se escondem da morte, não querem nem ouvir falar sobre o assunto? E por que outras riem, fazem piada sobre temas escatológicos? Por que tantos filmes sobre a morte, nos títulos ou na sua temática? Por que a morte exerce tanto fascínio sobre algumas pessoas, a ponto de seduzi-las? Por que é musa inspiradora de tantos: músicos, poetas, escritores, profissionais de saúde e educação?
Tantas perguntas têm assoberbado a humanidade durante os tempos. Respostas foram trazidas pelas religiões, ciências, artes, filosofias, entretanto, nenhuma delas é completa e universal. São incompletas, embora possam ser, para algumas pessoas, num dado tempo, o que buscam, oferecendo, mesmo que provisoriamente, um sentimento de totalidade.
O tema da morte se tornou interdito no século XX (Ariés, 1977), sendo banido da comunicação entre as pessoas. Paradoxalmente, nesse mesmo século, a morte esteve e continua estando, no início do século XXI, cada vez mais próxima das pessoas, em função, principalmente, do desenvolvimento das telecomunicações. A TV introduz diariamente, em milhões de lares, cenas de morte, de violência, de acidentes, de doenças, sem a mínima possibilidade de elaboração, dado o ritmo propositalmente acelerado desse veículo. Então, ao mesmo tempo em que é interdita, a morte torna-se companheira cotidiana, invasiva e sem limites, e, embora essas mortes estejam tão próximas (real ou simbolicamente), reina uma conspiração do silêncio. Crianças e adolescentes convivem com essas imagens diariamente, ao mesmo tempo em que se tenta “poupá-los” para não os entristecer.
Por outro lado, o surgimento e o aumento dos casos de AIDS e de câncer em crianças e adolescentes faz com que vivenciem o estar doentes, hospitalizados por longos períodos, privados de brincadeiras, dos amigos, das atividades escolares, das relações amorosas, da formação da identidade, ao mesmo tempo em que convivem com a perspectiva da morte. O desenvolvimento da tecnologia médica, os diagnósticos e tratamentos cada vez mais sofisticados trouxeram o prolongamento da vida, embora nem sempre tenhamos garantia da qualidade desta, principalmente no caso dos idosos.
Embora essas mortes estejam tão próximas, ocorre grave distúrbio na comunicação que denominamos conspiração de silêncio; observam-se pais que não sabem se devem falar ou não sobre a morte de um parente próximo, professores que se vêem às voltas com perguntas insistentes sobre mortes de ídolos, de pequenos companheiros, de amigos, e profissionais de saúde que se empenham numa luta de vida e morte contra as doenças, e que, muitas vezes, vêem seus empenhos frustrados, e não sabem o que e como falar com seus jovens pacientes e familiares sobre o porquê da não melhora e sobre a possível morte.
Há idosos que perdem cônjuges com os quais compartilharam uma vida toda e que sentem que a vida acaba por ocasião da morte, ou que sofrem de longas doenças degenerativas que causam grandes dores, limitações e sofrimento e das quais não têm com quem falar. Essas são questões cotidianas. O desenvolvimento da tecnologia médica e dos diagnósticos e tratamentos cada vez mais sofisticados trouxe o prolongamento da vida, embora nem sempre tenhamos garantia da qualidade desta, principalmente no caso dos idosos. A importância de enfocar o tema da morte está ligada ao fato de que, ao falar desta, estamos falando de vida e, ao falar de vida, a qualidade da mesma acaba sendo revista. Esta vem decaindo, em parte, pelo lugar ao qual a morte foi relegada no século XX: do interdito, do vergonhoso, do oculto – uma inimiga a ser vencida a qualquer custo. Quanto mais se nega a morte, mais esta parece fazer-se presente através da violência urbana, do crescimento do número de pessoas portadoras do HIV, do suicídio, das guerras.
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